Infidelidade consentida, sim ou não?
As mulheres são mais recetivas a relações abertas, os traidores são ciumentos por natureza e não querem ser traídos, e há países onde se trai mais do que noutros (ou onde se responde com mais sinceridade a inquéritos). Vejamos como tudo isto se encaixa.
Monogamia
O tema infidelidade é, a vários níveis, interessante. Até porque se for consentida, uma traição deixa de o ser e passa a ser um acordo. Porque nos unimos apenas a uma única pessoa no formato de relações monogâmicas que se pretende que durem toda a vida? Por vontade própria? Por indicação genética. Determinação cultural? Mera convenção social? Estaremos talvez mais perto da verdade se aceitarmos as duas últimas possibilidades, já que diferentes culturas, distintas configurações demográficas e diferentes ditames religiosos definem uma grande variação de receitas para as relações afetivas. Então, porque não refinar ainda mais essa versatilidade e aceitar uma infinidade de possibilidades, tornando cada entendimento único? E mesmo dentro de cada relacionamento aceitar que há momentos distintos que podem exigir diferentes soluções de entendimento sexual. Aceitar que alguém que amamos e nos ama possa satisfazer o seu desejo e ímpeto sexual com outra pessoa.
Longe dos primeiros anos de descoberta mútua, de desejo e paixão, em que tudo é novidade e fresco, não é difícil – é até provável – que a monotonia vá retirando o brilho aos sentimentos, e que uma vida sexual sem criatividade acabe em frustração e ressentimento. Em vez de acatar essa infelicidade como uma fatalidade, porque não definir regras mais abertas, que aceitem a liberdade individual de satisfazer necessidades fora do casamento e, assim, reoxigenar o amor? Não seria um favor que se fazia ao casamento? Não seria uma possibilidade de manter estável e até feliz uma união que prometia desmoronar de tédio e insatisfação?
O dilema não é assim tão fácil de resolver, como todos aqueles que envolvem sentimentos. A traição tem por base o rompimento de um acordo mútuo, jurado e/ou sacramentado, e a isto se juntam sentimentos de posse e a incurável dor dos corações partidos, devastados por uma traição. Tudo mudaria de figura se as relações extraconjugais não se definissem como traição e antes como algo acordado e permitido pelas partes. Falamos de relações abertas, onde, sem dramas, é permitido ter relações sexuais com outros parceiros, mas nas quais, ainda assim, há a certeza do regresso a casa e da manutenção da parceria amorosa primária. Uma forma talvez mais correta e justa de admitir que há sempre um elemento sexualmente mais ativo do que o outro, o que desequilibra a balança da satisfação e promove sentimentos de rejeição por parte do parceiro com maior apetite sexual.
Infidelidade consentida
Importa conseguir estar no lugar do outro. Um exercício que permite entender e possivelmente aceitar outras perspetivas sobre amor, sexo, relações e casamento. Mas este é um exercício complexo e difícil, no qual nem mesmo os traidores conseguem passar com mérito. Aquilo que quase exclusivamente opõe traidores e não traidores é a distinção que os primeiros estabelecem entre sexo e amor, enquanto os amantes fiéis reúnem ambos os conceitos como faces de uma mesma moeda. Por isso, os traidores podem, ainda assim, amar perdidamente a/o companheira/o e encontrar desculpa para os seus atos nessa dicotomia. “Foi apenas sexo” é uma justificação recorrente, que coloca a traição física num insignificante patamar, bem mais abaixo de uma paixão ou de um caso amoroso com alguém por quem se sente algo mais do que mera atração.
Muitos casais, sem prejuízo do conforto e felicidade conjugais, estabelecem regras permissivas, que contemplam a possibilidade de ambos poderem ter casos extraconjugais revelados abertamente. Sem o obstáculo do sexo (pouco satisfatório, pouco frequente, ou demasiado exigente…), duas pessoas que se amam podem focar toda a atenção naquilo que verdadeiramente os une e encontrar uma felicidade duradoura. Um entendimento que mantém os sentidos alerta, sem risco de monotonia e que pode mesmo fomentar e alimentar o desejo sexual do casal. Claro que, para muitos, relação aberta é um contrassenso, na medida em que um casamento é um compromisso e quem não está disposto a assumi-lo pode simplesmente manter-se livre e solteiro.
Traição
A infidelidade consentida, no seio de uma relação aberta e despreconceituosa, não é para todos. Puritanismos pessoais, constrangimentos sociais, pouca abertura dentro do próprio casal para quebrar tabus e a excitação do segredo abrem mais facilmente o caminho à traição, aos encontros esporádicos e apaixonados com amantes de circunstância ou que ativamente se procuram em sites de infidelidade. Pessoas casadas, mas insatisfeitas ou apenas sexualmente aventureiras que procuram realizar fantasias e prazer sexual, sem prejuízo do amor que sentem pelos parceiros, preferindo ocultar algo que entendem não ser verdadeiramente significativo, com receio de deitar a perder o amor e todo o bom entendimento que existe noutras esferas da relação. Um caminho, a traição, que cerca de um milhão de britânicos contempla e que já é trilhado por cerca de 36% dos finlandeses, por exemplo. Uma pool europeia liderada pelos dinamarqueses, país onde quase metade da população admite já ter traído os parceiros, pelo menos, uma vez.
Curiosidades inesperadas
O mais curioso, segundo dados estatísticos disponíveis, é que homens e mulheres que traem são possessivos e ciumentos e não aceitam a ideia de partilhar a pessoa amada. Ou seja, encontram desculpas para os seus atos, mas não as consideram para justificar igual comportamento por parte das/os parceiras/os.
- Homens e mulheres que traem não estão disponíveis para serem traídos.
- Quem trai está confiante de que as/os parceiras/os jamais os traíram.
- Quem mantém relações sexuais fora do casamento assume não estar disponível para ter relacionamentos abertos nem se imagina a experimentar troca de casais.
- As mulheres são mais recetivas do que os homens a manter relações abertas.
- Apenas cerca de um quarto das mulheres inquiridas admite nunca ter apanhado os parceiros a namoriscar outras mulheres.
- Um terço dos homens responderam já ter visto as parceiras a flirtar com outros homens.
- Mais de 90% dos homens e quase 75% das mulheres diz nunca ter apanhado as/os parceiras/os a trair.
- Os traidores não querem ser apanhados.
Mais acertado do que avançar com uma (inexistente) resposta definitiva à pergunta do assunto deste artigo, e mais correto do que guiar-se por estatísticas será perceber, individualmente, aquilo que melhor responde às necessidades e sensibilidades de cada relação.